Bíblia. (Foto: Emmanuel Phaeton / Unsplash)
Por Carlito Paes
Pode parecer um tanto estranho e até incoerente, mas temos que admitir que muitos de nós cristãos evangélicos conhecemos pouco da graça e do amor de Deus.
É estranho porque basicamente o cristianismo é fundamentado na teologia do amor, perdão e da graça de Deus, a qual afirma que o Eterno Deus misericordiosamente nos amou e enviou o Seu filho Jesus Cristo para a nossa salvação.
Como está escrito no verso mais destacado do Novo Testamento: “Porque Deus tanto amou o mundo que deu o seu Único Filho, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna.” (João 3:16). Diante disso, deduz-se que toda a ação amorosa de Deus em torno do ser humano é permeada pela graça, que etimologicamente significa “favor imerecido”, ou seja, não há em nós absolutamente nada que possa atrair o mínimo do cuidado de Deus.
Somos imerecedores de qualquer bênção dos Céus, mesmo aquelas que consideramos comuns como: a bênção de respirar, a bênção de ver a luz do sol a cada manhã ou a bênção de desfrutar da refrescante chuva após uma tarde de calor. Somos o povo que alcançou o favor do Pai.
Não é curioso que sendo toda a história da salvação permeada pela graça divina conheçamos tão pouco desse atributo de Deus? Talvez a explicação para isso esteja no lado oposto da graça, onde mora o legalismo e a religiosidade humana.
O legalismo é uma forma de ver a vida e também uma forma de se relacionar com Deus e com as pessoas. Trata-se de uma proposta de vida baseada em pressupostos de justiça própria, isto é, o conceito de que as atitudes de justiça por parte do indivíduo concederão a ele direitos em relação às bênçãos de Deus e à vida melhor que Ele pode nos dar. Sendo assim, a pessoa legalista experimentará um sentimento interior de possuir crédito junto ao Todo Poderoso.
De forma prática, a proposta do legalismo funciona da seguinte maneira: a pessoa aprende que quanto mais íntegra for sua vida, maiores serão as bênçãos que ela alcançará. Então ela passa a tentar agradar a Deus com atitudes que entende serem de acordo com os princípios bíblicos aprendidos.
No entanto, ela descobre que nem sempre isso é possível, devido suas limitações e sua natureza pecaminosa. Em vista disso, a pessoa começa a experimentar uma culpa interior por ser pecador, por desagradar a Deus, por sentir-se em débito com o Eterno e por achar que a qualquer momento Deus irá castigá-la.
Sendo assim ela se esforça ainda mais para cumprir os preceitos bíblicos a fim de agradar a Deus. Como não consegue, passa a experimentar uma culpa maior ainda, além de um sentimento de inadequação. Começa a pensar que Deus já não a ama como antes e que a qualquer momento poderá perder sua salvação. A sua religião se torna neurótica e o indivíduo passa a viver sob o peso insuportável de um julgamento interior (de si mesmo) e exterior (da lei).
Este é o momento perigoso em que duas coisas podem acontecer: ou a pessoa se desequilibra emocionalmente e passa a viver uma vida dupla tornando-se um cristão problemático ou ela abandona a fé, culpabilizando alguém e a si mesmo, além disso, carrega mágoa e dor para o resto de sua vida. Esta é o porquê de muitas pessoas ligadas à fé cristã estão deprimidas, isoladas, internadas em hospitais psiquiátricos, e alguns, rabugentos, amargosos e até revoltados com família e instituições religiosas.
Por esta razão, é importante ler a Bíblia, ter uma fé cristã saudável, equilibrada e sensata, não tendo expectativas erradas sobre a realidade humana e a proposta de Deus para cada um de nós. Jesus deseja que seus seguidores sejam pessoas sadias emocional e espiritualmente.
Precisamos retornar à mensagem da graça de Deus, que diz que o Pai Celestial nos aceita como nós somos, que nos ama do mesmo jeito a cada dia e que nos abençoará tão somente pela Sua misericórdia e não em função de nossas ações.
Entender a graça de Deus significa entender que o Eterno não reagirá às nossas ações, somos nós que reagimos às Suas ações de amor e de cuidado constante.
Se servimos a Deus, se procuramos viver de forma íntegra, se procuramos agradar a Deus com o nosso viver, não porque achamos que isso atrairá as bênçãos dos Céus sobre nossas vidas, agimos assim como uma resposta de amor a um amor maior. Mais do que nunca precisamos de mais graça e menos julgamento, mais reconciliação e perdão.
Estou convicto que precisamos de uma fé que nos tire da pressão ao invés de aumentar o peso sobre nossos ombros. Talvez precisemos ouvir do Eterno as mesmas palavras que o apóstolo Paulo ouviu em determinado momento de sua vida: “A minha graça te basta, porque o poder se aperfeiçoa na fraqueza” (2 Coríntios 12:9, ARA).
Talvez isso aquiete os nossos corações e nos torne pessoas mais tranquilas e serenas, com um coração cheio de fé e amor, e menos cheio de religiosidade fundamentalista ou idólatra, baseado num ambiente de amor e graça, mediante a um relacionamento pessoal de amor com a pessoa de Jesus em nossa vida.
O mundo precisa saber o que a igreja é a favor, porque o que somos contra já está bem claro para o mundo sem Cristo. Devemos amar mais e julgar menos, porque não podemos esperar comportamento de santidade de quem ainda nem conhece a Jesus como Salvador e Senhor. Um cristão sem a vida na graça, é um cristão sem graça.
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